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sexta-feira, julho 07, 2006

SE O RILKE FOSSE O PORTEIRO DO MEU PRÉDIO
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- Bom dia, dona Rebeca. Como vai?
- Ih, seu Rilke, hoje acordei meio de mal com a vida...
- Dona Rebeca, deixe-me dizer o que sempre digo para os meus filhos: Devemos aceitar a nossa vida tão completamente quanto possível. Tudo, mesmo o inconcebível, deve tornar-se possível. No fundo, a única valentia que nos é pedida é a de fazermos face ao singular, ao maravilhoso, ao extraordinário que se nos deparar. Custou bem caro à vida que os homens, neste ponto, tivessem sido débeis.
- Tem razão, seu Rilke, mas dá mesmo pra confiar no universo?
- Não temos nenhuma razão de desconfiar do universo, porque este não nos é contrário. Se existem terrores, esses terrores são os nossos; se há abismos, são os nossos abismos; se há perigos, devemos esforçar-nos por amá-los. Se construirmos a nossa existência sobre o lema de que devemos sempre dar preferência ao mais difícil, tudo o que ainda hoje nos parece singular se tornará familiar e fiel. Como olvidar esses mitos antigos que se encontram no início da história de todos os povos, os mitos dos dragões que, no momento supremo, se transformam em princesas? Todos os dragões da nossa existência são talvez princesas que esperam ver-nos, um dia, belos e audazes. Todas as coisas assustadoras não são mais, talvez, do que coisas indefesas que esperam que as socorramos.
- Nossa, seu Rilke, o senhor é inspirado, hein? Podia escrever um livro!
- Que nada. Sou apenas um simples porteiro...
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Pensei no Rilke como porteiro por ter escrito, num post anterior, SEU RILKE. O tratamento "seu" me remete àqueles porteiros que todos gostam de ter no prédio: educados, simpáticos, de confiança, e que sempre têm um comentário pertinente.
Também gosto da idéia de que pessoas do nosso cotidiano mais banal são as que podem nos dar conselhos valiosos - e realmente válidos - para a vida. É no anonimato que muitas vezes se esconde o tesouro.
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E sobre isso, acabo de me lembrar do nosso amigo Don Diego. Faz uns dois meses que não o vejo porque ele estava de férias e os nossos horários não têm coincidido.
Como já lhes disse, meus irmãos e eu somos fãs desse cobrador de ônibus, que é uma das pessoas mais nobres que conhecemos.
Ele sempre tem uma sabedoria guardada no bolso, pronta a ser compartilhada com o primeiro passageiro que lhe dirigir a palavra.
Se bem que, na última vez em que nos falamos no ônibus, ele estava chateado porque o filho que é professor de matemática trabalha o dia inteiro e ganha menos do que ele, que é cobrador de ônibus somente no turno da noite.
Pena que os políticos não andem de ônibus...
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Ah! E os conselhos do SEU RILKE vieram, novamente, do livro Poemas e Cartas a um Jovem Poeta.
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